segunda-feira, 14 de maio de 2007

A sombra calcorreia o passeio na jornada do regresso.
Está cansada, a sombra, sugada pela (in)vontade. Ninguém a deixa ímpar – intrínseca na voz que a leva.
Porque me queres?, quer saber.
E chora. E chora na verdade: não consegue ser só.
A sombra sonha – sonha muito - com o dia em que encontra o sangue banhado pelas carícias do seu harpejo – aquele dos afagos e abraços.
A angústia persegue-te: diz-te quem és., ouve dizer.
E triste está; pobre manta de sorriso sombrio. Disfarça-se todos os dias de voz colateral humana. A lua é pecado à luz da sua alma. Pela noite; na noite; a noite.
Porque me persegues?, implora à luz sempre altiva – monstra vil.
A dor alimenta-te: lança-te ao chão. Levanta-se, a sombra. Levanta-se vagarosamente à medida que passa pela chama – aquela que a olha sem tremeluzir. As duas vagueiam uma pela outra; nos caminhos do regresso: simbiose. Não quero olhar, saber quem ganha quando a luta é tão desigual.
Não chores, menina sombra., choro eu também, Minha linda menina sombra.
Olho-a: é corcunda num eixo sem beleza. Olho-a enternecida e penso que sim, era lindo: e se a menina sombra agarrasse no brilho e o guardasse numa bolsa do estômago? E se essa manta de todos nós, matéria baixa e corpulenta, conseguisse libertar a luz a partir de si própria, gerando ao mundo os pedaços que já ninguém quer ver? A luz a brotar da sombra: ah!
Serias feliz assim, sombra?, embalo-a; quero saber.
Não. Só quero ser só.
E chora. E chora na verdade: não consegue ser só.
A única – ela, sombra. Porque todos somos sós e ela chora; chora por si, embriagada nessa saudade: não consegue ser só.

1 comentário:

Anónimo disse...

Pergunto-me se vais ficar por aqui ou se ainda vais escrever mais.
De qualquer forma achei o texto muito intersante. Pois enternece-me a forma como tu falas da sombra que é somente aquele rasto pretoque nos segue para todo o lado.
Parabéns!