terça-feira, 26 de fevereiro de 2008

Ai se eu pudesse,
ai se eu pudesse invadir esse ar
Ai se eu pudesse
se eu pudesse destruir e enterrar
a existência como minha maldição
endoidecer com um trago de vinho
e o vinho ser tão somente o chão.
Ai se eu pudesse
se eu pudesse ir ao fundo
e trazer desse mundo
numa gota a força cruzada
pelos remoinhos da chuva cerrada.
Ai se eu pudesse
se eu pudesse
jorrar o sal que deixei no caminho
Ai se eu pudesse
cobrir o cais de abandono sozinho
e guardar no bolso um naco de lembrança
como quem quer perpetuar a pujança.
Ai se eu pudesse,
ai se eu pudesse
fazer do globo
o teu manto de sangue turvo
e ver nos olhos o trigo dos ecos
o sol dos Entrudos
palavras soltas de poetas sem rumo.
Ai se eu pudesse
cair depois de uma noite sem luz.
Subir pelo ramo da voz que seduz.
Ai se eu pudesse,
se eu pudesse
estar lá em cima pra te poder matar
com o tiro de quem está a definhar
e ser eu a origem da doença
pela verdade de teres sido a crença.
Ai.
Ai, se eu pudesse
atirava tudo isso lá para fora
e guardava no papel o recado:
esse momento
O momento
o do meu fado.

1 comentário:

Anónimo disse...

A letra que encontra a canção perdida: o fogo de um fado que é muito mais que um mero destino que suplica o abraço que recusa invocação - teima em soltar a dor: oblitera a voz, que se escuta em cada pausa, em cada fracção deste momento repousado na pedra púrpura em chamas.
A canção imagina-se e move-se única.